20 junho 2009

ecos. na Terra


image by madalena pestana

olhando o que restou da Obra feita

nas mãos de Deus azedou o vinho da cerimónia

image by pericoterrades

entendida a Mensagem. na Terra. a água afundou

abandonando o homem

19 junho 2009

Nómada


image by Michal Karcz


no mistério da estrada o incógnito. absoluto

nem uma só palavra. desleixada. perdida

a desvendar passados. longínquos tal o tempo

absortas as árvores apelam novos rumos

...e o vento passa longe!

transporta no cinzento das nuvens

a espessura dos sonhos


by Brian Kerr

silêncio a silêncio

construída a vazios. talhada osso em pedra

cresce a história dos homens.


aquela ou outra estrada gravaram-lhes os passos

esqueceram-lhes os sons

deixam marcas nas rochas

cantos de urgente voz. tecidos ardua-mente


houve pressa no erguer-se. lentidão em partir.


vindos. nascidos de onde?

rios em sulcos de pedra. caminham

para que foz?


16 junho 2009

o sorriso. de Deus.



shadow_riders_by_mmhhrr

terra onde a morte vive. assim é nos desenhos sinistros do solo. assim é nos silêncios. nos rostos vazios de sorrir. assim é.

no mundo. hoje. de hoje.

de escutaram o nome. desde a infância. mas era outro o Deus. outra a face que lhe emprestavam.

o deus de hoje. hoje não sorri. nem ele.

a vida marca passo ao compasso de relógios histéricos.

correria.

perda de tempo em cada salto dado. a correr.

não se entendem as gentes num voltear de moscas zombideiras.

fazem tremer os outros com um rosnar de boneco de corda a imitar ferozes predadores.
olham qualquer espelho em torno. auto aplauso. e correm. correm. correm.

ninguém sabe para onde.

ou porquê.


depois a chuva chega. por minutos.

tudo para. até os automóveis. esses uns contra outros. morre-se porque chove.

poucos mas alguns estacam. a escutar. a água. essa que cai. sem hora certa. cada vez menos vezes.

desce o olhar ao chão quem não tem medo disso.

azulou. o espírito da água anulou os zombies. transparece a calçada. o ar é leve.

dos relógios afugou-se a histeria.

art by external linq

- não se inquietem essas sobras de gente. o calor vai voltar. e secar. tudo.

e Deus continuará a não sorrir.

13 junho 2009

feminino

image by ahituna

desenha árvores na areia para que as recordem.

depois daquele dia. o dia do incêndio global. calor extermínio onde o verde não cabe. onde o verde se apaga. onde o azul é cinza ou nevoeiro de onde não surge nada nem ninguém. sobretudo não esperança.

só o vento manterá a sua dança feito ar ardente. sobre rochas eternas. mais escavadas mas lá. perfuradas, alisadas mas ainda lá. porque não ardem. só porque não ardem.


image by photoscot

mas há uma mulher. escondendo o corpo. em meio à rocha. defendendo no ventre um ovo. fecundado.

lá em baixo o rio na areia deixa que o vento apague os traços inúteis de árvores mortas e volta a sussurrar.

há recomeço onde a fúria do feminino dê em lutar. se a Vida é causa.

12 junho 2009

vazio

image by kresimir kopcic

o jogo tem nítidos lugares

as peças têm movimentos seus

oblíquos. rectos. saltos

as peças voam mais que as muitas almas


depois é só limpar o barulho do jogo

e perde quem não entra na jogada


a vida tem mistérios insondáveis

mas é um tabuleiro de xadrez.

vazio. depois.

11 junho 2009

arte de viajar


image by fwscharpf


uma aranha. uma aranha tem quatro pares de patas úteis e uma carapaça. desloca-se devagar sobre todos os caminhos. tece. tece e às vezes usa a seda to seu tecer para dormir. não precisa complicar a vida para obter descanso.

assim se quereria hoje. semelhante a uma mansa aranha sem veneno.

caminhar beira rios, em rochas, campos. conhecer todos os recantos da terra. devagar. devagar. tocar o chão sem se deixar prender a ele. usar duas árvores o vento e a sorte para tecer arte. descansar num casulo protegendo os ovos.

ter por destino controlar as pragas.

deveria haver aranhas para impedir pragas de gente. não há.

deita-se na areia que de noite é fresca e adormece.

09 junho 2009

paraíso e inferno

The Gate by `aquapell

não há secura ou espaço silêncio ou solidão que nos livre da graça de sonhar. se a verdade não está no ascestismo nem na paz ou na água, quem sabe o sonho lha venha entregar?

não pensa nisso. apenas adormece.
há um portão de ferro que separa o paraíso do inferno. e ela usa toda a força para o quase abrir. quase fechar. criança em baloiço de adultos.

de nenhum dos lados sabe o que a espera. por isso não o fecha nem se atreve a escolher. não tem palavras escritas o portão, que lhe digam - vem por aqui. nós temos a verdade. e ainda que as houvesse podia ser engano.
diziam-lhe na infância ser o diabo um anjo transviado. bem capaz de enganar.

ao depertar recorda e não sorri. esteve tão perto. sentiu a intensidade da luta entre dois anjos de poder. apenas não sabia a linguagem.
do que por lá escutou não tem nada a contar.

seguirá o caminho. mente em frente. nada a levará a desistir.

08 junho 2009

sobre a pele de um rio


image by Torqual


o vento deformou o traçado da areia. é mais difícil ver o curso de água. lá de cima. manhã solta já.

apura o olhar no enfrentar da luz. cansam-se os olhos. o ar assobia ritmos estranhos nos canais das dunas.

- hoje é o dia dele. do elemento ar.

e neste constatar quase sufoca. o pó avermelhado invadiu-lhe a garganta. as narinas. deitou-se então ao chão e rolou duna abaixo. criança a embalar-se e a escorregar.

quando sentiu a dureza da pele do rio seco é que se ergueu. teria ainda muito por andar.

uma nesga de verde no horizonte garantia-lhe o caminho certo.



image by videopixels

- o tempo é meu. caminho passo a passo pelo meu rio na areia.

não pensou em cansaço. só na água. a que seguraria nas mãos. como quem reza.

a magnífica água de purificar e de beber.


image by jameshervey


07 junho 2009

a festa


image by SteveVodhanel

camuflada a gruta. tão camuflada que só o faro aguçado de animal em caça a encontraria. fez disso sua casa. de mais não precisava.
pela manhã buscaria bagas, ervas ou peixe. a água corria um pouco mais abaixo. escutava-lhe o som de cristais a tocar-se em mesa de banquete. sorriu. cobriu-se com a pele que levara ao partir. quase da cor da rocha. dera-lha a avó sem saber para onde ia ao despedir-se. - talvez a uma festa. e acertara. o saber da idade é mesmo assim.

quando os morcegos regressassem da sua dança silenciosa saberia que era tempo de erguer-se e começar a procurar.

árdua a tarefa que escolhera.
a Verdade é uma ave branca esvoaçando entre nuvens, também elas brancas todas. difícil ao olhar humano distinguir.


meditei. acreditem. não me ocorreu mais nada...




Obrigada Zeca, pela presença, na Hora!

peso

não fosse a gravidade e seria ave livre. ar vibrante a sol. na protecção de todos os que amasse.

image by ~fall0n

não é.

à custa dessa lei não passará de mais um mistério. só pedra. enterrado no chão.


picture at kanishksharma.wordpress

06 junho 2009

coisas de fera-gente

art by snik38

os lobos uivam e é infindável o rio de sangue a crú que se derrama nas almas da cidade. reviu.

regressa. pés ainda feridos do correr.

no seu deserto sem nome nem país, uma ave acena. chegou enfim a casa.

é urgente dormir para amanhã, ao despertar, esquecer. matando esse passado. reganhando o direito a um presente. de paz.


image by benarts

04 junho 2009

sarasvati - o rio


image by MustafaDedeogLu


o longe que puder. mais longe ainda que os fins já conhecidos. é para lá que vai.
leva no dorso a saudade do trigo. pouco mais. é peso leve mas ainda muito. de caminho o aliviará. tem como certo.
na noite sabe do sabor da luz. de dia dorme as estrelas haja nuvens ou não.

ainda não sente dor. anestesia da liberdade conseguida. dentro.

e cavalga o destino na direcção do rio que acaba no deserto.

image by MustafaDedeogLu



01 junho 2009

o caminho

image by_StigmaChina


nas estradas comuns tudo parecia errado. tudo era errado. levou tempo a entender porquê. talvez demais. do pouco tempo que ainda era seu já pouco lhe sobrava. sensações.

saiu do asfalto. sentou-se num montículo de terra. a decidir. decidir é coisa diferente quando se parte como ela. sem bagagem nem rumo.

assim fez um traço no chão. o mais nítido que conseguiu. com as garras dos dedos. saltou por cima dele. era a sua fronteira.

- nunca. nunca mais volto para trás.

pés nús

image by Gugune


no soalho letras. nada mais que isso. de fora a luz agressiva a querer matar a escuridão desejada. merecida.

as letras não fazem palavras. nem sons.

as letras são objectos caídos no soalho.

lá de fora entra uma nesga de ar. não purifica. lembra que o ar existe. des-po-luí-da-mente. muito longe.

é hora de quê?

- só de partir.

partiu.